Entenda a importância de cuidar da saúde mental de pais de filhos com autismo

Responsáveis de crianças no espectro autista lidam diariamente com diversos desafios que afetam profundamente sua saúde mental.

Da Redação
02/04/24 • 16h06

Além das crianças com TEA, os pais também devem contar com um acompanhamento psicológico. (Foto: Enfance Terapias)

Famílias que têm filhos diagnosticados com Transtorno do Espectro Autista (TEA) enfrentam uma série de desafios no dia a dia. Especialmente para as mães, que frequentemente se veem como as principais cuidadoras, essa realidade implica uma dedicação intensa e constante, impactando diretamente seu bem-estar e saúde mental. A responsabilidade de prover cuidados especiais e atenção adequada a crianças com necessidades distintas acaba por se tornar o centro da rotina dessas famílias, exigindo adaptações significativas em seu cotidiano.

O TEA é classificado em diferentes níveis de severidade, que vão do leve ao severo, cada um demandando um grau variado de apoio e intervenções especializadas. Enquanto crianças com autismo leve podem necessitar de menos suporte, aquelas com condições mais severas requerem uma assistência substancialmente maior. Essa diferenciação enfatiza a necessidade de uma compreensão ampla sobre as especificidades do espectro autista e de como elas afetam a vida dos envolvidos.

Jardênia Passos e o pequeno Victor Emanuel durante a preparação para o ABC da criança. (Foto: Arquivo pessoal)

Para um diagnóstico preciso do TEA, é fundamental a avaliação por uma equipe multiprofissional, incluindo médicos, psicólogos, fonoaudiólogos e terapeutas ocupacionais. Esse processo multidisciplinar é crucial para entender as necessidades da criança e planejar o melhor curso de ação para seu desenvolvimento e bem-estar.

O impacto do diagnóstico na dinâmica familiar varia significativamente. Algumas famílias conseguem se adaptar e organizar suas vidas em torno das necessidades da criança com TEA, enquanto outras podem experimentar desgastes e conflitos internos em decorrência das demandas constantes e intensivas de cuidado.

“Muitos são os desafios de uma pessoa que é responsável por uma criança que está dentro do espectro autista. Vi recentemente na internet a citação de uma pesquisa que revelava que o estresse de uma mãe atípica é semelhante à de um soldado de guerra. A maioria das pessoas não conhecem a guerra porque não vivenciaram. Então existem situações na rotina de um cuidador que são desconhecidas à maioria. A inserção dessa criança em sua comunidade ou na escola são desafios enormes. E a constante necessidade de intervenção, seja em casa ou em uma simples saída à praia, ao shopping, ao parque, ou em outros momentos prazerosos, podem se transformar em situações bastante estressantes”, testemunha Jardênia Passos, mãe do garoto Victor Emanuel Passos.

Para muitas mães, assumir a responsabilidade pelo cuidado de um filho com TEA significa colocar de lado aspectos significativos da própria vida, incluindo carreira profissional, relações sociais e tempo para si mesmas. Esse sacrifício pode levar a consequências sérias para a saúde física e mental, destacando a importância do apoio e compreensão para essas cuidadoras. Jardênia Passos revela como minimizou esse impacto.

Além da mãe, Victor também tem um acompanhamento especializado. (Foto: Enfance Terapias)

“Uma pergunta importante em tudo isso é: como cuidar do cuidador? Como olhar para o cuidador e ver a necessidade de cuidar de sua saúde mental? A saúde mental do cuidador é tão prioritária quanto da criança. E eu, como mãe atípica, percebo essa necessidade em mim. E diante disso, procuro fazer atividades que me proporcionam prazer. Ao mesmo tempo que eu proporcionar ao meu filho atividades que possam lhe dar felicidade, é necessário que eu também esteja feliz. Então procuro fazer uma atividade que me sinta bem, que eu possa recarregar minhas energias pra enfrentar os desafios diários. Seja ler um livro, ir a um café, conversar com os amigos. É necessário também ter um suporte emocional através de terapias.

Nesse contexto, é vital reconhecer não apenas as necessidades das crianças com TEA, mas também o impacto dessas demandas nos pais e cuidadores. A busca por tratamentos adequados, aliada às dificuldades de comunicação e interação social, representa um desafio diário. Por isso, enfatiza-se a necessidade de suporte e recursos adequados para assegurar o bem-estar de toda a família, garantindo que os cuidadores também recebam a assistência e o reconhecimento necessários para enfrentar essa jornada.

Imersa nessa realiadade, Jardênia dá um recado aos pais que passam por uma situação parecida com adela. “Não guarde suas emoções. Não hesite em pedir ajuda e se priorize. O autocuidado é necessário também. Como vamos dar a alguém aquilo que nós não temos? Então é necessário se priorizar, ter momentos em que você tenha prazer, que lhe proporcionem felicidade, para que você tenha todo o suporte emocional necessário para poder ajudar a pessoa que você cuida a enfrentar os desafios da vida”, conclui.

Máyra Laís atua na pesquisa em Aprendizagem e Cognição do grupo de pesquisa do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia sobre Comportamento, Cognição e Ensino. (Foto: Enfance Terapias)

Ajuda profissional
Dra. Máyra Laís, mestra em psicologia e co-fundadora da Clínica Enfance Terapias, destaca que é fundamental que os pais reconheçam suas próprias necessidades emocionais e encontrem maneiras de cuidar de si mesmos e superar os cenários que irão enfrentar.

“A gente precisa pensar no suporte emocional que esses pais precisam, pois eles se deparam com sentimentos conflitantes, podendo, inclusive, sentir culpa, ansiedade ou tristeza. Ao cuidar de uma criança com TEA, temos que entender que o pai e mãe necessitam desse suporte emocional para que tenham condições de amparar seus filhos e serem parte no desenvolvimento das habilidades da criança, inclusive na questão social. A sociedade ainda tem muito a aprender sobre a inclusão, e os pais acabam sofrendo por conta disso”.

A psicóloga reforça que a rotina é algo importante para qualquer criança, especialmente para aquelas com TEA. Por isso, a estabilidade emocional dos responsáveis, além de fundamental para o próprio indivíduo, é crucial para conseguir equilibrar as necessidades do filho.

“Os pais precisam ser cuidados. Com o devido apoio psicológico, é necessário traçar estratégias de enfrentamento para poder gerenciar o mais diversos conflitos que se revelarão e que geram situações de estresse. Os pais são fundamentais para o processo terapêutico, principalmente para promover uma melhor comunicação com o filho e conseguir encontrar esse bem-estar familiar”, reforça Máyra Laís.